quarta-feira, 1 de julho de 2015

A NOVA MUSEOLOGIA NA AMERICA LATINA-O CASO MEXICANO.
Patrícia Berg Oliveira*


Palestra da autora em 25 de junho de 2015 na FABICO-Curso de Museologia/Disciplina: BIB 03237 História dos Museus e dos Processos Museológicos.

A palestrante apresentou um histórico da população mexicana sua história política, a partir de 1810. Também trouxe o relato da participação de representantes do México nos encontros do ICOM desde 1958 e a Nova Museologia em território mexicano, através do PRODEFEM-Programa para Desenvolvimento da Função Educativa nos Museus e o Programa de Museus Comunitários e Ecomuseus. 
O México participou, inclusive com sua experiência, dos eventos realizados em 1958-Rio de Janeiro(Seminário sobre Função Educacional dos Museus), 1962-México(O Museu como Centro Cultural da Humanidade), 1972-Chile(Mesa-Redonda sobre o Desenvolvimento e Papel do Museu no Mundo Contemporâneo), 1984-Canadá (Princípios de Base de uma Nova Museologia) e 1984-México(Território-Patrimônio-Comunidade (Ecomuseus)-O Homem e seu Entorno. Nas primeiras discussões já integra aos seus discursos de museu ao conceito de comunidade. Seus representantes também vêm o museu como modificador da realidade e problematizam a questão social na interface com museus. Em 1972, em Santiago do Chile, Mário Vasquez propôs a criação de museu integrado no âmbito do Museu Nacional de Antropologia/México. Trouxe indígenas (origem da maioria da população mexicana) para construir exposição sobre o tema. Na Casa Del Museo aplicava o conceito de patrimônio do homem, gerido pelo homem em seu interesse, em detrimento do tradicional coleta-expõe. Propõe o espaço onde a contribuição cultural daquele grupo deveria ser compreendida, democratizando os museus, com seus problemas cotidianos. O resultado foi um processo de conscientização da população acerca de seu patrimônio.  
No depoimento sobre os programas citou o Programa de Desenvolvimento das Funções Educativas nos Museus(1983-1992) que se baseou na experiência da Casa Del Museo e o projeto de Museus Escolares. Apesar de finalizado, rendeu a criação de perto de 100 museus escolares em território mexicano. A partir de 1993, amparado nas experiências anteriores com atenção às populações rurais, mestiças e indígenas, foi dado início ao Programa de Museus Comunitários-Ecomuseus que propõe ações solidárias no convívio social, integrado ao meio no qual vivem.       



Museólogo Mario Vasquez em 2013, homenageado na Universidade Nacional do México. 



Fontes:

Palestra em aula
VASCONCELLOS, Camilo Mello. Imagens da Revolução Mexicana: o Museu Nacional de História do México (1940-1982). São Paulo: Alameda, 2007.
docvirt.com/docreader.net/WebIndex/WIPagina/BibVirtMHN/5463
http://www.jornada.unam.mx/2013/01/25/cultura/a06n1cul

Sobre a autora: Pedagoga, Mestre em Educação pela UFRGS, atualmente responsável pelo Fundo Municipal de Apoio à Produção Artística e Cultural do município de Porto Alegre-RS. .


Museus em tempos de guerra:

Quem vê as obras expostas de Velázquez, Goya, e Rubens no Museu do Prado, em Madrid, pouco sabe da história de corajosos espanhóis que, em busca de segurança, dalí removeram em mais de 1.800 caixas este patrimônio artístico espanhol em plena Guerra Civil Espanhola. Acondicionadas em caixas preparadas para este fim, as obras foram levadas em caminhões para Valência, posteriormente para Catalunha e Genebra e retornaram íntegras durante a Segunda Guerra ao solo espanhol.
Este fato é relatado no filme LAS CAJAS ESPAÑHOLAS de 2004 de Alberto Porlan e no livro ÉXODO Y EXILIO DEL ARTE: LA ODISEA DEL MUSEO DEL PRADO DURANTE LA GUERRA CIVIL de Arturo Colorado Castellary.  Em sua jornada enfrentam vários perigos, como bombardeios aéreos do grupo nacionalista e até obstáculos físicos, como no episódio no qual a baixa altura de uma ponte obrigou os transportadores e remover as obras dos caminhões e ultrapassá-la carregando pessoalmente as caixas. O período no qual as obras ficaram ausentes do Museu do Prado foi de  nov-1936 quando a cidade de Madrid se viu sitiada e o governo se transferiu para Valência a set-1939, já no regime do General Francisco Franco.   

Inventário das peças.


Preparo das caixas para transporte.

Todo processo de realocação esteve a cargo da Junta de Defesa do Tesouro Artístico Nacional e, prévio ao seu início, foram realizadas operações para garantir a integridade das peças: seleção, exame das condições nas quais se encontravam, elaboração de fichas para seu registro(medidas, autor, nome, saída, chegada..), preparação e colocação nas caixas de transporte, preparo da frota de caminhões, entrega e colocação das obras nos depósitos provisórios que as abrigaram nestes quase três anos.  
Abrigadas na Suíça devido ao avanço das tropas nacionalistas que promovia a realocação do governo espanhol e das obras, se constituiu o Comitê Internacional para Salvaguarda do Tesouro Espanhol quando foram transportadas à Suíça. Solicitada em 1939 a devolução ao povo espanhol, um trem sai de Genebra e, com luzes apagadas para escapar dos bombardeios já em meio ao conflito da 2ª Guerra, devolveu as obras ao Museu do Prado em outubro de 1939.
Ao trazer ao público esta história, o livro e o filme homenageiam o gesto de coragem e amor à arte de cidadãos espanhóis, incansáveis na salvaguarda de importante patrimônio.     
 
Transporte em caminhões para seus depósitos provisórios.


Reposição do acervo no Museu do Prado-Madrid. 


FILME DISPONÍVEL EM: https://www.youtube.com/watch?v=_k8GSiiiM98
http://www.uhu.es/cine.educacion/cineyeducacion/historia_guerracivil_bicicletas.htm

Há hipocrisia no lamento por Palmira

Por: Luiz Antônio Araujo-Jornal Zero Hora-Porto Alegre-RS
22/05/2015 -
Hipocrisia é um dos ingredientes mais abundantes nos lamentos pelo destino de relíquias históricas do Iraque e da Síria diante do avanço do dito Estado Islâmico-EI. No caso do Iraque, o saque ao patrimônio histórico e cultural começou muito antes da existência do EI: data do momento mesmo em que as forças americanas entraram em Bagdá, em abril de 2003.

Um levantamento feito por iniciativa do próprio governo americano na época da invasão listou entre 14 mil e 15 mil peças roubadas do Museu do Iraque. A pilhagem teria sido obra de pelo menos três grandes grupos: ladrões profissionais (miraram tesouros valiosos), vândalos (surrupiaram cerca de 3 mil artefatos arqueológicos) e empregados do próprio museu (interessados em joias e cilindros de selo).
Patrimônio artístico e cultural sempre foi alvo fácil durante conflagrações. Em 2012, centenas de obras de arte suspeitas de terem sido pilhadas pela Alemanha foram descobertas na casa do filho do famoso colecionador Hildebrand Gurlitt, negociador de “arte degenerada” durante a era nazista, em Munique.
Hitler exigiu que Paris fosse arrasada em 1944 (como ocorreria com Varsóvia), e as maravilhas da capital francesa só sobreviveram porque a ordem foi desobedecida. Os museus do Afeganistão foram arrasados nos últimos 20 anos. Pouco resta da arte do período Khmer no Camboja depois que o Depósito de Conservação de Angkor foi arrasado pela guerra civil nos anos 1970.
Nada disso absolve o EI de seus crimes flagrantes contra o patrimônio cultural, como os registrados em Mossul, Nínive e Nimrod. Em artigo publicado na revista The New Yorker, o repórter americano Dexter Filkins lembra de ter visitado Palmira em 2003 e pensado que, afinal, o ditador Bashar al-Assad merecia crédito por deixar o oásis em paz – algo que provavelmente não poderá ser dito em relação ao EI.
Ruínas da cidade romana Palmira, na Síria, que já foi importante ponta da Rota da Seda. 
A ironia é que, entre domingo e quinta, as forças de Al-Assad parecem ter simplesmente fugido de Palmira. Agora, só um milagre pode salvar a cidade histórica.


O “Colecionismo Ilustrado” na gênese dos museus contemporâneos. 

 ALMEIDA, Cícero Antonio Fonseca de(1)

A partir do século XVIII, no contexto sócio-político de nascimento dos estados nacionais europeus, fortalece-se a noção de patrimônio que deve ser preservado, representando a nação.  A prática colecionista anterior, entretanto, é que deu lastro a este (re)descobrimento do valor simbólico presente nos objetos e obras.
Torna-se importante compreender  esse processo quando os objetos perdem seu função original e, envolvidos em desejos e intenções, recebem um novo significado. Os objetos de uma coleção deixam de ser utilizados na forma em que foram concebidos e passam a ter significado. Mesmo objetos construídos ‘sem função’ passam componentes de um novo sistema onde são analisados à luz da cultura que os envolve.  Passam a ser ‘recontados’ pelos olhares de quem os adquiriu e do público visitante.  Pomian(2) sintetiza a transformação de objeto utilitário para objeto-símbolo nas coleções e nos museus:


...as fechaduras e as chaves que não fecham nem abrem
porta alguma....aos relógios que ninguém espera a hora
exata...Tudo se passa como se não houvesse outra finali- 
dade do que acumular os objetos para os expor ao olhar...
  
A ‘invenção’ do museu.
A Revolução Francesa que fortaleceu o conceito de ‘patrimônio nacional’ foi o ponto de partida dessa nova concepção expandida posteriormente aos nascentes estados nacionais. Sob as normativas da Assembléia, bens da igreja e da nobreza foram confiscados para se tornarem, como propriedade pública, símbolos da nação emergente.  A partir daí, vê-se o nascimento do Louvre-na própria sede monárquica, do museus dos Monumentos Franceses e outros, com a denominação de museu, que já vinha identificando estes espaços desde o Renascimento(sec XIV-XVI).  O resgate dessa denominação  rende homenagem à Alexandria como local de estudos e discussões entre sábios. 
Se a consolidação dos estados nacionais contribuiu para a formação dos museus, também há de se incluir nesse processo o colecionismo, herdado da Antiguidade Clássica com sua releitura nos valores iluministas que buscavam explicações racionais do mundo e resgate dos valores da Antiguidade.
Louvre
Foi no Iluminismo, baseado na ciência e na razão, que à pratica colecionista se incorporaram as características vistas nos museus públicos contemporâneos pois se intensificou o proceder científico, sistematizando e especializando o conhecimento. Os gabinetes de curiosidades começaram a assim se orientar, reorganizando-se. Publicam-se inventários da natureza e as obras artísticas contextualizam-se nos períodos históricos. Na prática colecionista, foi deixada  de lado a ‘curiosidade’ e ‘raridade’ para agregar os conhecimentos histórico e científico, como hoje os vemos.     
      


(1)Sobre o autor:
Museólogo, com mestrado em Memória Social e Documento pela Universidade do Rio de Janeiro-RJ, professor da Escola de Museologia da UNIRIO.


Fontes:
ALMEIDA, Cícero Antonio Fonseca de. O “Colecionismo Ilustrado” na gênese dos museus contemporâneos. Anais do Museu Histórico Nacional. Rio de Janeiro: Ministério da Cultura/IPHAN, nº 33, 2001.p.123-140.    
  

 (2) Pomian, Krzysztof. Coleção.In Enciclopédia Einaudi. vol.1, Memória-História. Lisboa: Imprensa Nacional/Casa da Moeda, 1983.