quarta-feira, 1 de julho de 2015

O “Colecionismo Ilustrado” na gênese dos museus contemporâneos. 

 ALMEIDA, Cícero Antonio Fonseca de(1)

A partir do século XVIII, no contexto sócio-político de nascimento dos estados nacionais europeus, fortalece-se a noção de patrimônio que deve ser preservado, representando a nação.  A prática colecionista anterior, entretanto, é que deu lastro a este (re)descobrimento do valor simbólico presente nos objetos e obras.
Torna-se importante compreender  esse processo quando os objetos perdem seu função original e, envolvidos em desejos e intenções, recebem um novo significado. Os objetos de uma coleção deixam de ser utilizados na forma em que foram concebidos e passam a ter significado. Mesmo objetos construídos ‘sem função’ passam componentes de um novo sistema onde são analisados à luz da cultura que os envolve.  Passam a ser ‘recontados’ pelos olhares de quem os adquiriu e do público visitante.  Pomian(2) sintetiza a transformação de objeto utilitário para objeto-símbolo nas coleções e nos museus:


...as fechaduras e as chaves que não fecham nem abrem
porta alguma....aos relógios que ninguém espera a hora
exata...Tudo se passa como se não houvesse outra finali- 
dade do que acumular os objetos para os expor ao olhar...
  
A ‘invenção’ do museu.
A Revolução Francesa que fortaleceu o conceito de ‘patrimônio nacional’ foi o ponto de partida dessa nova concepção expandida posteriormente aos nascentes estados nacionais. Sob as normativas da Assembléia, bens da igreja e da nobreza foram confiscados para se tornarem, como propriedade pública, símbolos da nação emergente.  A partir daí, vê-se o nascimento do Louvre-na própria sede monárquica, do museus dos Monumentos Franceses e outros, com a denominação de museu, que já vinha identificando estes espaços desde o Renascimento(sec XIV-XVI).  O resgate dessa denominação  rende homenagem à Alexandria como local de estudos e discussões entre sábios. 
Se a consolidação dos estados nacionais contribuiu para a formação dos museus, também há de se incluir nesse processo o colecionismo, herdado da Antiguidade Clássica com sua releitura nos valores iluministas que buscavam explicações racionais do mundo e resgate dos valores da Antiguidade.
Louvre
Foi no Iluminismo, baseado na ciência e na razão, que à pratica colecionista se incorporaram as características vistas nos museus públicos contemporâneos pois se intensificou o proceder científico, sistematizando e especializando o conhecimento. Os gabinetes de curiosidades começaram a assim se orientar, reorganizando-se. Publicam-se inventários da natureza e as obras artísticas contextualizam-se nos períodos históricos. Na prática colecionista, foi deixada  de lado a ‘curiosidade’ e ‘raridade’ para agregar os conhecimentos histórico e científico, como hoje os vemos.     
      


(1)Sobre o autor:
Museólogo, com mestrado em Memória Social e Documento pela Universidade do Rio de Janeiro-RJ, professor da Escola de Museologia da UNIRIO.


Fontes:
ALMEIDA, Cícero Antonio Fonseca de. O “Colecionismo Ilustrado” na gênese dos museus contemporâneos. Anais do Museu Histórico Nacional. Rio de Janeiro: Ministério da Cultura/IPHAN, nº 33, 2001.p.123-140.    
  

 (2) Pomian, Krzysztof. Coleção.In Enciclopédia Einaudi. vol.1, Memória-História. Lisboa: Imprensa Nacional/Casa da Moeda, 1983. 

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