quarta-feira, 1 de julho de 2015

Há hipocrisia no lamento por Palmira

Por: Luiz Antônio Araujo-Jornal Zero Hora-Porto Alegre-RS
22/05/2015 -
Hipocrisia é um dos ingredientes mais abundantes nos lamentos pelo destino de relíquias históricas do Iraque e da Síria diante do avanço do dito Estado Islâmico-EI. No caso do Iraque, o saque ao patrimônio histórico e cultural começou muito antes da existência do EI: data do momento mesmo em que as forças americanas entraram em Bagdá, em abril de 2003.

Um levantamento feito por iniciativa do próprio governo americano na época da invasão listou entre 14 mil e 15 mil peças roubadas do Museu do Iraque. A pilhagem teria sido obra de pelo menos três grandes grupos: ladrões profissionais (miraram tesouros valiosos), vândalos (surrupiaram cerca de 3 mil artefatos arqueológicos) e empregados do próprio museu (interessados em joias e cilindros de selo).
Patrimônio artístico e cultural sempre foi alvo fácil durante conflagrações. Em 2012, centenas de obras de arte suspeitas de terem sido pilhadas pela Alemanha foram descobertas na casa do filho do famoso colecionador Hildebrand Gurlitt, negociador de “arte degenerada” durante a era nazista, em Munique.
Hitler exigiu que Paris fosse arrasada em 1944 (como ocorreria com Varsóvia), e as maravilhas da capital francesa só sobreviveram porque a ordem foi desobedecida. Os museus do Afeganistão foram arrasados nos últimos 20 anos. Pouco resta da arte do período Khmer no Camboja depois que o Depósito de Conservação de Angkor foi arrasado pela guerra civil nos anos 1970.
Nada disso absolve o EI de seus crimes flagrantes contra o patrimônio cultural, como os registrados em Mossul, Nínive e Nimrod. Em artigo publicado na revista The New Yorker, o repórter americano Dexter Filkins lembra de ter visitado Palmira em 2003 e pensado que, afinal, o ditador Bashar al-Assad merecia crédito por deixar o oásis em paz – algo que provavelmente não poderá ser dito em relação ao EI.
Ruínas da cidade romana Palmira, na Síria, que já foi importante ponta da Rota da Seda. 
A ironia é que, entre domingo e quinta, as forças de Al-Assad parecem ter simplesmente fugido de Palmira. Agora, só um milagre pode salvar a cidade histórica.


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